Meu Primeiro Processo Judicial: Erros, Acertos e Lições Que Moldaram Minha Advocacia
Processo nº: 0705811-50.2022.8.07.0003
Este foi o meu primeiro processo. Quando ele chegou até mim, não havia praticamente nada em favor da cliente — nem prova clara, nem conforto jurídico. Só um problema real e muita necessidade de estratégia.
Quando Peguei o Processo, Eu Não Tinha Nada
Quando assumi a defesa no processo nº 0705811-50.2022.8.07.0003, me deparei com uma situação que qualquer advogado iniciante teme: não havia prova documental consistente a favor da parte que eu representava.
A petição inicial estava frágil, os anexos não sustentavam o que era pedido, e a narrativa dependia muito mais de afirmações verbais do que de comprovação objetiva. Em resumo, era um caso visto por muitos como “causa perdida”.
Mas esse processo tinha um detalhe especial: era o meu primeiro processo judicial. Eu não podia simplesmente aceitar a derrota como destino. Esse caso seria a prova viva do tipo de profissional que eu queria ser.
O Desafio de Atuar Sem Provas Claras
A grande dificuldade era simples e brutal: como defender alguém quando você não tem documentos fortes, recibos claros, contratos formais, ou qualquer lastro material robusto?
Esse tipo de cenário obriga o advogado a atuar em outro nível. Se você não tem a prova na mão, você precisa construir coerência.
E foi exatamente esse o caminho que eu escolhi: usei contra-argumentação inteligente para transformar a própria versão da outra parte em material que fortalecia a minha tese.
Como Usei a Contra-Argumentação Para Criar Prova Indireta
Uma das maiores lições desse processo foi descobrir que, mesmo quando você entra sem prova “de papel”, você ainda pode trabalhar com prova construída pela lógica.
Em vez de simplesmente repetir a versão do meu cliente, eu fui ponto a ponto em cima do que a outra parte alegava. Isso é técnica de prova por coerência narrativa: quando a parte contrária se contradiz ou muda de versão, isso gera valor probatório, porque mina a credibilidade dela.
Essa estratégia é especialmente útil em casos em que:
- há alegação verbal de pagamento ou troca (por exemplo, veículo adquirido por permuta);
- há promessa não formalizada por escrito;
- há conflito sobre quem é responsável pelo ato (transferência de titularidade, entrega de documento, etc.).
Esse tipo de abordagem me permitiu fazer algo essencial: mesmo sem ter prova física pronta, eu consegui mostrar para o juízo que havia um contexto, um histórico de negociações e responsabilidades entre as partes.
Ali eu entendi, na prática, o que eu só tinha lido em teoria: mais do que decorar artigos, advocacia é raciocínio estratégico.
Meus Acertos Como Advogado Nesse Primeiro Processo
Mesmo sendo meu primeiro caso, houve passos muito técnicos que foram acertos reais e que eu repetiria hoje.
1. Leitura minuciosa dos autos
Eu li cada peça, cada resposta, cada reconvenção e cada réplica como se fossem mapas. Isso parece óbvio, mas não é: muita gente lê “por cima”. Eu não pude me dar esse luxo.
2. Respeito absoluto ao rito processual
Todos os prazos foram cumpridos com disciplina. As manifestações vieram devidamente protocoladas, sem perda de prazo e com fundamentação alinhada ao Código de Processo Civil.
3. Posicionamento claro em audiência
A fase de prova oral foi conduzida com foco. Fiz perguntas pensando não só no que eu queria ouvir, mas no que eu precisava que constasse formalmente nos autos.
4. Uso estratégico da reconvenção e da ilegitimidade
Houve discussão sobre quem realmente poderia pedir o quê em nome de quem. A sentença deixou claro que ninguém pode pleitear direito alheio em nome próprio sem previsão legal (art. 18 do CPC), e isso derrubou parte da pretensão reconvencional.
Isso mostra algo importante: mesmo quando o mérito principal não é acolhido, você pode neutralizar ataques contrários com base técnica. E isso, para um primeiro processo, vale ouro.
Meus Erros — e Como Eles Me Fizeram Crescer
Eu também errei. E é impossível falar em amadurecimento profissional sem reconhecer isso.
Erro 1: não exigir documentação sólida logo no início
No calor de tentar ajudar, aceitei iniciar a demanda com uma base documental muito fraca. Hoje, eu sei: antes de judicializar, eu preciso esgotar a coleta de provas materiais (contratos, recibos de pagamento, comprovantes de transferência, prints de conversa, áudio, testemunhas chave com qualificação completa).
Erro 2: argumentar com emoção demais em alguns pontos
Em alguns trechos, a argumentação vinha carregada de indignação (“causou imenso desconforto”, “resistência injustificável na transferência do veículo”). Isso é humano, mas o Judiciário não decide por indignação. Ele decide por prova, coerência e tipicidade jurídica.
Erro 3: confiar que o juiz “perceberia” a injustiça
Esse é o erro clássico de quem está começando. Justiça não é percebida: justiça é demonstrada, articulada e comprovada nos autos. Eu tive que aprender isso olhando a sentença.
Esses erros me ensinaram a ser mais objetiva, mais técnica e mais exigente na fase pré-processual.
Lições Aprendidas no Meu Primeiro Processo Judicial
Esse caso mudou minha forma de advogar. Cada lição abaixo veio da prática, não de livro.
- Nem todo caso “perdido” é realmente perdido. Às vezes, ele é só um caso que exige inteligência jurídica acima da média.
- Quando você não tem prova documental, você precisa construir prova argumentativa. A coerência pode virar evidência indireta.
- Advocacia é técnica, mas também é leitura humana. O interrogatório certo na hora certa muda o rumo do processo.
- Cada improcedência também é um degrau. Mesmo com o pedido julgado improcedente, eu saí muito mais preparado para o próximo processo.
- O Art. 18 do CPC é arma de defesa. Saber quem pode — e quem não pode — pedir algo nos autos salvou meu cliente de consequências piores.
- Disciplina processual gera respeito. Cumprir prazo, protocolar certo e manter o processo organizado comunica profissionalismo, mesmo quando você ainda está no início da carreira.
Esse Caso Definiu Quem Eu Sou na Advocacia
Ao final, o juízo declarou a improcedência do pedido principal e também da reconvenção. Na prática, cada parte arcou com seus ônus, e o mérito foi resolvido com base no art. 487, I, do CPC.
Para quem lê de fora, isso pode parecer apenas mais uma sentença. Para mim, não. Para mim, foi meu batismo.
Esse processo foi a prova de que eu sou capaz de sustentar uma tese, enfrentar audiência, trabalhar sob pressão e agir com inteligência jurídica mesmo sem ter tudo na mão.
Hoje eu entendo algo muito importante: o primeiro processo judicial não serve só para ganhar. Ele serve para revelar qual tipo de profissional você vai ser quando as coisas não estão fáceis.
Quer saber mais?
Se você está entrando agora na advocacia e quer entender como construir uma defesa forte mesmo sem provas perfeitas, eu posso ajudar.
Leia também: Como montar sua primeira ação com estratégia (mesmo quando o cliente não tem todos os documentos).
Leia também: O que é contra-argumentação jurídica e por que ela pode salvar um processo inteiro.
 

Comentários